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Dilma e os bancos: a comemoração e o temor


No Dia do Trabalhador, não houve brasileiro assalariado ou pequeno empresário que tenha ficado indiferente ao pronunciamento da presidenta Dilma na noite de ontem. Com seu estilo duro e meio sem jeito, falou aquilo que todo cidadão minimamente incomodado com os lucros dos bancos no país gostaria de dizer, ao “chamá-los na chincha” e cobrar sua parte no esforço para o desenvolvimento do país.

“É inadmissível que o Brasil, que tem um dos sistemas financeiros mais sólidos e lucrativos, continue com um dos juros mais altos do mundo. Esses valores não podem continuar tão alto. O Brasil de hoje não justifica isso”, afirmou a presidenta. “Os bancos não podem continuar cobrando os mesmo juros para empresas e para o consumidor enquanto a Taxa Básica Selic cai, a economia se mantém estável, e a maioria esmagadora dos brasileiros honra com presteza e honestidade os seus compromissos. O setor financeiro, portanto, não tem como explicar essa lógica perversa aos brasileiros. A Selic baixa, a inflação permanece estável, mas os juros do cheque especial, das prestações ou do cartão de credito não diminuem”, continuou.

Discurso irrepreensível. De tão bom, chego a ficar com receio do que possa vir por aí. Dilma, ao longo de seus 16 meses de mandato, já deu mostras de que não dá muita bola para certos acertos politicos tradicionais. Agora, ao bater de frente contra o mercado financeiro, encara um adversário muito mais poderoso.

A chamada “grande mídia”, para variar, já mostrou hoje de que lado está. “Veja”, por exemplo, preferiu ignorar qualquer análise sobre o que siginifica essa postura de enfrentamento e criticar Dilma, dizendo que seu gesto foi inspirado em recentes atos da presidenta argentina Cristina Kirchner.

O troco virá em breve. E virá pesado. O alvo mais fácil será a necessidade de alterar o rendimento da poupança à medida em que a taxa de juros diminuir. Apesar de serem casos completamente diferentes, a memória do confisco de Collor ganhará destaque no "Jornal Nacional", enquanto o Bradesco patrocina cada um de seus intervalos comerciais, satisfeito pelo bom trabalho do jornalismo da Globo. Representantes dos banqueiros dirão que a atitude do governo brasileiro afasta os investimentos estrangeiros, em um momento inadequado, por conta da crise financeira internacional. Miriam Leitão aparecerá no "Bom Dia Brasil" como costumeira porta-voz da turma da bufunfa. Os especialistas de sempre em finanças serão chamados a explicar a irresponsabilidade do governo do PT.

A conferir. Espero, de verdade, estar enganado. Mas desconfio que as pancadas serão bem dadas, doloridas. Se você não viu o pronunciamento de Dilma, fica a dica:


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