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Copa de 2014: sem exageros ou vexame


Atrasou o ônibus? Pode ter certeza: alguém no ponto vai comentar algo como "e ainda queremos organizar a Copa?". Metrô parou? Faça uma contagem regressiva: em menos de dez segundos haverá um cidadão para dizer que "desse jeito vamos passar vergonha na Copa". Estou longe de apoiar efusivamente a organização do Mundial por aqui, ainda mais com a série de exigências da Fifa, mas esse papo de utilizar o evento como pretexto para reclamar de tudo o que há de errado no Brasil tem me deixado puto.

Para minha satisfação, leio na coluna de Tostão, hoje, na "Folha", um ponto de vista que  considero ideal, com comparações realistas, expectativas possíveis e críticas na medida correta (como no caso do incentivo público à construção de estádios privados). Segue abaixo o texto:

A Copa da Fifa

As perguntas que mais escuto são se o Brasil vai ganhar e se vai organizar uma ótima Copa do Mundo.

Imagino que os estádios estarão prontos, que serão confortáveis, bonitos, que os aeroportos e outros meios de transporte vão melhorar -piorar não tem jeito-, que os turistas serão bem recebidos (o brasileiro é gentil), que não haverá nenhuma catástrofe e que a violência será menor que a habitual, já que os baderneiros e os marginais, de rua e de colarinho branco, também gostam de futebol. E ainda se acham patriotas.

Nada será excepcional nem tão ruim. Na África do Sul, mesmo com credencial de jornalista e ingresso, ninguém conseguiu, em um jogo, achar meu lugar marcado. Mais de uma vez, ficamos mais de uma hora para estacionar em volta do estádio, no lugar marcado. Cada funcionário dizia uma coisa.

Na Alemanha, vi jornalistas sentados no chão, trabalhando com seus computadores, porque não havia cadeira e mesa para todos.

O Ministério do Esporte e os membros do comitê da Copa não precisam ser presunçosos e dizer que o Brasil fará a melhor Copa da história. Basta fazer uma boa Copa.

De fortes empresários a ambulantes, todos querem faturar com a Copa. Duvido que

a Fifa, dona do Mundial, mesmo garantida pela Lei Geral da Copa, evite a pirataria e

a venda de produtos não credenciados.

Melhorar os caóticos aeroportos e outros meios de transporte não será legado deixado para a população. São obrigações do governo, que já deveria ter feito há muito tempo.

Problemas sempre existem em todos os países. Grave é anunciar que não haveria dinheiro público, o que não é verdade. Grave é subsidiar estádios particulares. Grave são os elefantes brancos, como os de Manaus, Natal, Brasília e Cuiabá, onde não há um time na Série A do Brasileiro. Grave são as desapropriações de casas humildes, em volta de estádios que serão, depois, pouco usados. Grave são os atrasos nas obras, que aumentam os custos e facilitam as falcatruas.

E o Brasil vai ganhar a Copa? Em casa e se melhorar, terá boas chances. Absurda é a tabela. Se o Brasil não chegar à final, o que hoje seria o esperado, não haverá um único jogo da seleção no Maracanã.

Em casa, não basta ganhar. O torcedor vai exigir excelente futebol. Vencer do jeito do Chelsea não será suficiente. O Barcelona perdeu seis claríssimas chances de gol. Mesmo assim, os analistas de resultados disseram que a defesa do Chelsea anulou o Barcelona.

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