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Três do Chico

Fuçando em e-mails antigos, achei os textos do blog anterior, encerrado em 2006. Peguei três deles – todos com alguma menção ao Chico Buarque, já que fazia tempo que não publicava nada sobre ele aqui – e joguei num post só:

2004 - Entrevista ao “La Vanguardia”

O compositor resume o atual momento de sua vida:
"Tenho 60 anos. Nasci e vivo no Rio de Janeiro. Estou separado e tenho três filhas, duas netas e meia e um neto: Chico. Sou um democrata que ainda crê na possibilidade de um socialismo democrático. Já vivemos quase duas décadas de idiotice globalizada. Sou ateu. Publico 'Budapeste' pelas editoras Salamandra em castelhano e La Magrana em catalão".

LV - Sempre fugiu da fama?
Chico - Não, participei de festivais e busquei o reconhecimento de meu trabalho. Mas depois vem a fama boba, oca, que é a sombra do reconhecimento e que cuida de se o artista está gordo ou com quem vai para a cama. Há 40 anos não era assim.

LV - Como era?
Chico - Veja, estávamos todos bêbados em Ipanema dizendo coisas absurdas, mas nada disso saía na imprensa. Hoje a gente vai assistir a uma partida de futebol e vem o jornalista perguntar como está a partida. Não gosto disso tudo.

2005 - Vomitando em Chico Buarque

É incrível, mas conheci alguém que vomitou em Chico Buarque. O mais impressionante é que esse alguém pertence ao sexo feminino e, apesar de não ser fãzona do único gênio vivo da música brasileira, até que gostava bastante do feioso.

Eu não saberia contar o causo com o mesmo talento que a autora do vômito. Por isso, vou tentar transcrever suas palavras com o máximo de fidelidade possível. A identidade da dita-cuja fica em segredo.

"Foi durante a Copa de 1994. Eu trabalhava na Folha e estava cobrindo Brasil x Holanda. Quando a Holanda empatou o jogo, eu comecei a passar mal. E fazia um calor do cão, uns 40 e tantos graus. Não tava aguentando e acabei dando uma 'gorfada' no chão, no pé de alguém. Senti uma mão no ombro, perguntando se estava tudo bem, com uma voz calma demais pra alguém que tinha acabado de ser atingido por vômito. Eu comecei a reclamar, dizendo que íamos perder o jogo, e quando levanto a cabeça vejo que é o Chico Buarque falando comigo. 'A gente vai ganhar o jogo. Eu garanto', ele falou, enquanto meu chefe me dava a maior comida de rabo e mandava eu ir para o banheiro'.

De fato, o Brasil ganhou por 3 a 2, com um gol de falta do Branco. E o Chico deve ter jogado um par de sapatos fora.

2006 - Sobre assovios

É proibido assoviar — ou assobiar, como queiram, já que os dicionários permitem as duas formas. Aliás, não é proibido, apenas não se assovia nas ruas de São Paulo. Aquele que o faz recebe olhares de soslaio, sobrancelhas contraídas de desaprovação e, raramente, um sorriso incentivador, provavelmente de assobiadores em potencial, reprimidos pelo desuso de algo tão bacana.

Essa conclusão é precoce, admito. Tudo começou há menos de 24 horas, confesso, mas as primeiras impressões foram assustadoras. Explico a seguir como se iniciou essa observação.

No simpático livro “Folha Explica: Chico Buarque”, em determinado momento Fernando de Barros e Silva fala sobre a importância de “A Banda” no cenário musical dos anos 60. Para ilustrar de modo mais bacana o que a canção representou, o autor reproduz alguns comentários da imprensa daqueles idos. Nelson Rodrigues, sempre atento ao que se passava nas ruas do Rio de Janeiro, disse na ocasião que “A Banda” teve o importante papel de fazer o brasileiro voltar a assobiar. Genial!

Desci do ônibus com isso na cabeça, disposto a ver (e a ouvir) o quanto os brasileiros (ou os paulistanos) têm assobiado. A pesquisa de campo foi decepcionante: dois períodos de 15 minutos em pontos de ônibus diferentes... e nada de assobios. Os resultados do aprofundamento trouxeram dados mais interessantes.

Hoje acordei disposto a assobiar o máximo possível enquanto estivesse com gente ao meu redor. Fiz isso em dois pontos de ônibus, depois repeti a operação no trajeto da Paulista até meu curso de espanhol e ao longo dos três quarteirões que separam a empresa em que trabalho, na Avenida Queiroz Filho. Meu repertório foi restrito, é verdade, somente com “A Banda” e algumas marchinhas de carnaval, mas fica a sugestão: façam isso e reparem nas reações das pessoas.

A maioria me olhou com indiferença. Uma senhora ficou me olhando tão estranho que fiquei sem-graça. Um tiozinho esboçou um sorriso tímido. Outro senhor me olhou como se eu fosse um marginal. Uma moça gostosa que lavava a calçada da rua em que trabalho deve ter achado que fiz algum gracejo e soltou um “ghumpf!!”.

Continuarei com esse árduo trabalho nos próximos dias. Vou tentar algo mais contemporâneo para ver se as reações são melhores. Se houver boa aceitação, comentarei-as por aqui.

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